quinta-feira, 17 de março de 2011

O CHEFE DE ESTADO

Desde a Revolução Republicana de 05 de Outubro de 1910, Portugal tem, na chefia do Estado um Presidente da República. Contudo, o mais alto Magistrado da Nação nem sempre foi eleito como o é nos dias de hoje. Também neste aspecto, felizmente, verificou-se uma evolução política em Portugal. A Constituição Portuguesa de 1911 atribuía o Poder Legislativo ao Congresso da República, formado por duas Câmaras, denominadas Câmara dos Deputados e Senado. Segundo essa mesma Constituição, o Presidente da República era eleito e destituído pelo Congresso da República, sendo a eleição efectuada por escrutínio secreto e por maioria de 2/3 dos votos dos membros das duas Câmaras do Congresso reunidas em sessão conjunta. O mandato do Presidente da República era de 4 anos, mas o mesmo poderia ser destituído pelas duas Câmaras reunidas em Congresso, mediante resolução fundamentada e aprovada por 2/3 dos seus membros. A Constituição Portuguesa de 1933 veio a alterar essa forma de eleição do Chefe-de-Estado, passando este a ser eleito por sufrágio directo dos cidadãos eleitores para um mandato de 7 anos. Com a Revolução de Abril de 1974 foi elaborada uma nova Constituição, sendo que o Presidente da República passou a ser eleito por sufrágio universal para um mandato de 5 anos.

Hoje, quase um século depois da implantação da República e atingida a maturidade política em que vivemos, será perfeitamente compreensível e natural que a maioria dos portugueses não considere viável ou justificável uma mudança do actual regime político. No entanto, neste momento particular, quando o país caminha a passos largos para uma profunda integração europeia, cortando laços com as suas tradições, a sua cultura, a sua característica forma de vida e, inclusive, com o seu glorioso passado, importa questionar que papel terão os portugueses e o espaço físico que hoje é Portugal no contexto europeu. Assumiremos o papel de adaptáveis às novas realidades, perdendo as nossas raízes linguísticas e culturais, imitando os outros e transformando-nos em “clones” das grandes potências europeias em troca de vantagens económicas? Ou existirá algo mais a nos manter unidos, sob um objectivo comum - um desígnio nacional – e que nos dará um incentivo para continuarmos a ser nós mesmos num contexto europeu?

Ainda que a primeira hipótese possa ser vista como lunática, ou pouco credível, a verdade é que, neste momento, ninguém poderá fazer previsões sobre o futuro de Portugal e da Europa a médio e longo prazo e se, hoje, ainda existe uma relativa unidade nacional, em torno de um Governo, de um Presidente da República, de uma bandeira, de um hino nacional, de uma cultura que evoluiu num mesmo contexto e de uma mesma língua, a verdade é que, quando a Europa vier a ter o seu próprio Governo global, um Chefe de Estado comum, uma bandeira e um hino comuns, o próprio conceito de “pátria” será alterado, levando-nos, ainda que inconscientemente, a ver a Europa Unida como a nossa Pátria e Portugal como a nossa região europeia.

De que forma poderá, então, Portugal manter a sua integridade nacional num contexto europeu? Que outro factor será suficientemente forte para merecer a atenção, o respeito e a admiração de todos os portugueses?

No caso concreto de Portugal, existe algo que inspira orgulho na esmagadora maioria dos seus cidadãos: a sua história! São os nove séculos de história nacional, mais do que qualquer outro factor, que unem os portugueses na busca de um desígnio grandioso. É pela história que nos é comum, mais do que por qualquer outro factor, que hoje nos resignamos a fazer maiores sacrifícios em prol do colectivo, contribuindo para a manutenção de Portugal como Estado soberano e independente em todos os domínio.

Assim, importa perguntar:

- Estará um Presidente da República à altura de representar a gloriosa história de um país como Portugal?

- Será o Presidente da República, de facto, uma figura unificadora de todos os Portugueses?

- Resistirá a figura do Presidente da República, nos moldes actuais, a uma mais larga união europeia?

- Será realmente benéfico para Portugal a manutenção do actual regime republicano?

- Será a Monarquia democrática uma alternativa séria e viável ao regime republicano?

Não há duvidas de que o papel de Presidente da República é, por si só, bastante frágil. Contrariamente à figura de um Monarca, que tem um passado histórico à sua volta, que lhe dá uma áurea quase mítica, um Presidente é um cidadão comum, que se sujeita à guerra e à intriga política para assumir o papel de representante de todos os portugueses. Assim, quando eleito, já é uma figura com uma imagem desgastada, colheu ódios políticos e inimizades pessoais, além de dever a sua eleição à força política que apoiou a sua candidatura.

E esta ultima questão, leva-nos a fazer uma outra pergunta:

Que Presidente da República, num regime não presidencialista, consegue ser verdadeiramente independente no exercício das suas funções políticas, depois de ter colhido o apoio de uma determinada força política?

A resposta, necessariamente, é: nenhum!

Além de tudo o mais, há ainda a não esquecer o facto de que um individuo só pode ser Presidente da República durante, no máximo, dez anos seguidos. Assim, aquela figura que deveria ser aglutinadora do orgulho de todos os portugueses, ao fim de 10 anos terá que ceder o seu lugar a outro, que teve que enfrentar oposições e pressões, pedir favores e ficar a dever gratidões, em troca de um punhado de votos.

O artº 120º da Constituição define Presidente da República, da seguinte forma:

Artigo 120º
(Definição)

O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, Comandante Supremo das Forças Armadas.

Como já tivemos a oportunidade de verificar, a garantia de independência nacional, neste momento em que vivemos, encontra-se dependente da forma como crescerá a Europa Unida. Embora seja pouco provável que Portugal abdique, de facto, da sua independência, no futuro esse mesmo conceito de independência deverá passar a ser relativo, uma vez que todas as grandes decisões políticas, económicas e sociais serão ditadas pelo governo central europeu, passando os órgãos nacionais a assumir um papel de simples “governantes de secretária”, pondo a vigorar leis de pequena importância e a gerir a administração pública de acordo com as ordens exteriores.

Se é certo que a figura que se encontra na chefia do Estado não poderá impedir essa dura realidade que nos aguarda, não será menos verdade que, a sensação de independência nacional, será maior, quanto maior for a manutenção das suas tradições e da sua cultura próprias. Assim, independentemente das convicções político-partidárias de cada português, todos estarão de acordo que a cultura e tradições nacionais têm as suas raízes mais profundamente implantadas na Monarquia (cerca de sete séculos de história) do que na República (menos de um século de história), razão pela qual seria mais aglutinador de união em seu torno a figura de um rei, do que é actualmente a de um presidente da república.

O Presidente da República, enquanto chefe de Estado, deve ser um garante da unidade nacional. No entanto, como poderá tornar-se num factor de unidade nacional alguém que é eleito com o recurso ao confronto político? E particularmente quando esse confronto tem o apoio de forças político-partidárias que se esgrimam pela posse do governo nacional? Irremediavelmente, a posição de um Chefe de Estado eleito nessas circunstâncias é sempre alvo da crítica popular. Além de que a sua isenção é sempre considerada relativa pela maioria dos cidadãos. Cada promulgação, opinião, ou dúvida é sempre considerada resultante das pressões políticas exteriores e não vista como o resultado de uma opinião pessoal, que faz eco da vontade da maioria anónima.

Um individuo que exerce o seu cargo nestas circunstâncias, nunca poderá ser um factor de unidade do Estado.

A figura isenta de um monarca, que não tem que se sujeitar ao confronto político e partidário; que desde o seu nascimento é preparado para ocupar o cargo que o espera; que está ligado ao Estado pelos laços familiares do passado, a quem o país deve a sua própria fundação e existência; que é, no fundo, um representante vivo dos capítulos da história de que tantos se orgulham, reunirá, certamente, mais e melhores condições para garantir a unidade do Estado.

Encontrando-se o mesmo equidistante de todas as forças partidárias, será, igualmente, um garante do regular funcionamento das instituições democráticas, que poderão exercer o seu papel político sem temer a oposição de um Chefe de Estado eleito com o apoio de uma outra força política.

Outro papel que um monarca, enquanto Chefe de Estado, poderia exercer em Portugal, seria o de “embaixador” junto dos países de língua portuguesa. Pelo passado histórico que países como Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe ou Timor Loro Sae têm em comum, um representante vivo dessa mesma história poderá fomentar um estreitamento de relações, como hoje acontece, por exemplo, com a Inglaterra e os países da Commowelth. Para um Presidente da República, será sempre mais difícil assumir esse papel de unificador, pela falta de laços sólidos com o passado de Portugal e das ex-colónias portuguesas e pela divergência de ideais políticos que existem entre os Chefes de Estado e de Governo de cada um dos países.

Talvez a acrescentar a esta questão, não seja demais salientar que, presentemente, o actual Duque de Bragança – gostando-se ou não da sua figura - tem assumido, de uma forma mais ou menos particular, esse papel de “embaixador” junto dos países de expressão portuguesa, onde é recebido com grandes honras, como se de um verdadeiro Chefe de Estado se tratasse.

Relativamente às competências do Presidente da República, as mesmas encontram-se expressas nos artºs 133º a 138º da Constituição e são:

Artigo 133º
(Competência quanto a outros órgãos)

Compete ao Presidente da República, relativamente a outros órgãos:
a) Presidir ao Conselho de Estado;
b) Marcar, de harmonia com a lei eleitoral, o dia das eleições do Presidente da República, dos Deputados à Assembleia da República, dos Deputados ao Parlamento Europeu e dos deputados às assembleias legislativas regionais;
c) Convocar extraordinariamente a Assembleia da República;
d) Dirigir mensagens à Assembleia da República e às Assembleias Legislativas Regionais;
e) Dissolver a Assembleia da República, observado o disposto no artigo 172º, ouvidos os partidos nela representados e o Conselho de Estado;
f) Nomear o Primeiro-Ministro, nos termos do nº 1 do artigo 187º;
g) Demitir o Governo, nos termos do nº 2 do artigo 195º, e exonerar o Primeiro-Ministro, nos termos do nº 4 do artigo 186º;
h) Nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro;
i) Presidir ao Conselho de Ministros, quando o Primeiro-Ministro lho solicitar;
j) Dissolver os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, por sua iniciativa ou sob proposta do Governo, ouvidos a Assembleia da República e o Conselho de Estado;
l) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo e ouvido o Conselho de Estado, os Ministros da República para as regiões autónomas;
m) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o presidente do Tribunal de Contas e o Procurador-Geral da República;
n) Nomear cinco membros do Conselho de Estado e dois vogais do Conselho Superior da Magistratura;
o) Presidir ao Conselho Superior de Defesa Nacional;
p) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, quando exista, e os Chefes de Estado-Maior dos três ramos das Forças Armadas, ouvido, nestes dois últimos casos, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas.

Artigo 134º
(Competência para prática de actos próprios)

Compete ao Presidente da República, na prática de actos próprios:
a) Exercer as funções de Comandante Supremo das Forças Armadas;
b) Promulgar e mandar publicar as leis, os decretos-leis e os decretos regulamentares, assinar as resoluções da Assembleia da República que aprovem acordos internacionais e os restantes decretos do Governo;
c) Submeter a referendo questões de relevante interesse nacional, nos termos do artigo 115º, e as referidas no nº 2 do artigo 232º e no nº 3 do artigo 256º;
d) Declarar o estado de sítio ou o estado de emergência, observado o disposto nos artigos 19º e 138º;
e) Pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da República;
f) Indultar e comutar penas, ouvido o Governo;
g) Requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade de normas constantes de leis, decretos-leis e convenções internacionais;
h) Requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade de normas jurídicas, bem como a verificação de inconstitucionalidade por omissão;
i) Conferir condecorações, nos termos da lei, e exercer a função de grão-mestre das ordens honoríficas portuguesas.

Artigo 135º
(Competência nas relações internacionais)

Compete ao Presidente da República, nas relações internacionais:
a) Nomear os embaixadores e os enviados extraordinários, sob proposta do Governo, e acreditar os representantes diplomáticos estrangeiros;
b) Ratificar os tratados internacionais, depois de devidamente aprovados;
c) Declarar a guerra em caso de agressão efectiva ou iminente e fazer a paz, sob proposta do Governo, ouvido o Conselho de Estado e mediante autorização da Assembleia da República, ou, quando esta não estiver reunida nem for possível a sua reunião imediata, da sua Comissão Permanente.

Artigo 136º
(Promulgação e veto)

1. No prazo de vinte dias contados da recepção de qualquer decreto da Assembleia da República para ser promulgado como lei, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada.
2. Se a Assembleia da República confirmar o voto por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua recepção.
3. Será, porém, exigida a maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, para a confirmação dos decretos que revistam a forma de lei orgânica, bem como dos que respeitem às seguintes matérias:
a) Relações externas;
b) Limites entre o sector público, o sector privado e o sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção;
c) Regulamentação dos actos eleitorais previstos na Constituição, que não revista a forma de lei orgânica.
4. No prazo de quarenta dias contados da recepção de qualquer decreto do Governo para ser promulgado, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, comunicando por escrito ao Governo o sentido do veto.
5. O Presidente da República exerce ainda o direito de veto nos termos dos artigos 278º e 279º

Artigo 137º
(Falta de promulgação ou de assinatura)

A falta de promulgação ou de assinatura pelo Presidente da República de qualquer dos actos previstos na alínea b) do artigo 134º implica a sua inexistência jurídica.

Artigo 138º
(Declaração do estado de sítio ou do estado de emergência)

1. A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência depende de audição do Governo e de autorização da Assembleia da República ou, quando esta não estiver reunida nem for possível a sua reunião imediata, da respectiva Comissão Permanente.
2. A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência, quando autorizada pela Comissão Permanente da Assembleia da República, terá de ser confirmada pelo Plenário logo que seja possível reuni-lo.

De todas as actuais competências atribuídas pela força da Constituição ao Presidente da República, nenhuma é incompatível com a chefia do Estado por parte de um Rei, sendo que, algumas delas, poderão ser exercidas com uma maior isenção, como as que se seguem:

Das competências quanto a outros órgãos

  1. Sem qualquer ligação a forças político-partidárias, o exercício da presidência do Conselho de Estado será realizado de uma forma mais imparcial e isenta.
  2. A data da marcação de quaisquer eleições será feita independentemente da vontade dos partidos políticos, sempre tendo em atenção o dia que melhor convir aos portugueses e de acordo com o integral cumprimentos dos prazos legais.
  3. A convocação extraordinária da Assembléia da República, seria feita sempre que tal o justificasse e não de acordo com as pressões das maiorias partidárias.
  4. A nomeação dos cinco membros do Conselho de Estado e dos dois membros do Conselho Superior da Magistratura seria feita de uma forma mais isenta, tendo em atenção o real valor e experiência dos indivíduos nomeados e não as suas convicções políticas.

Das competências para práticas de actos próprios

  1. A promulgação e a ordem de publicação das leis, dos decretos-leis e dos decretos regulamentares, assim como a assinatura das resoluções da Assembléia da República que aprovem acordos internacionais e dos restantes decretos do Governo, será feita de uma forma muito mais imparcial, beneficiando, dessa forma, o bem estar democrático.
  2. A submissão a referendo de questões de relevante interesse nacional, será feita mais de acordo com a vontade manifestada pelo Povo e pela necessidade de um debate mais abrangente sobre uma determinada questão de interesse comum, do que tem sido até hoje.
  3. A declaração dos estados de sítio ou de emergência só será feita em casos de extrema necessidade e não por vontade de uma força política majoritária.
  4. A remessa de diversos diplomas ao Tribunal Constitucional só será feita quando surgirem fortes dúvidas sobre a constitucionalidade das leis e não, como até hoje temos assistido, por motivos políticos, ou pela simples pretensão de atrasar a entrada em vigor de determinada lei.
  5. As condecorações serão feitas de forma mais isenta e equidistante de factores político-partidários.

Já as suas competências ao nível das relações internacionais, poderão ser alargadas, nomeadamente através da criação de uma “Comunidade Lusófona”, que vise um maior intercâmbio político, cultural e económico entre Portugal e os países de expressão portuguesa, onde a figura de um rei poderia assumir um papel de maior destaque, nomeadamente como intermediário das negociações inter-estados dessa comunidade.

Outra responsabilidade que poderia passar a caber ao Chefe de Estado num regime monárquico e democrático, era o de preservador e guardião da cultura e do património histórico e arquitectónico nacionais. Actualmente verifica-se a existência de um abandono revoltante do património histórico em Portugal. São inúmeros os castelos e edifícios estatais que se encontram em ruínas ou votados ao abandono. O rei, como elo de ligação entre a história do passado e o momento presente, poderia, se para tal lhe fossem dados os necessários meios, preservar ou recuperar os vestígios de outras eras para a sua glorificação futura.

Tal tornaria Portugal num Estado muito mais rico culturalmente, incutindo no Povo o sentimento de orgulho e, por arrastamento, aglutinando-o em torno de uma maior unidade nacional.

Presentemente, que orgulho poderá ter um individuo em ser português, quando estuda a sua gloriosa história nas secretárias das escolas e, olhando ao redor, não vislumbra mais que cacos votados ao abandono?[1]

O aproveitamento desses espaços para fins culturais e turísticos, poderiam beneficiar em muito o país, desde que houvesse uma entidade que se responsabilizasse pela sua manutenção e divulgação. Basta observar o poder mediático que as figuras da realeza têm em vários países[2], para se concluir pela viabilidade de um projecto de reconstrução de monumentos dirigido por um monarca. A simples notícia da sua visita a um local recentemente aberto ao turismo, atrairia várias pessoas a esse local, tanto do interior do país, como além-fronteiras.

Essa era uma forma de Portugal publicitar ainda mais a sua existência no Mundo, mesmo num quadro de uma mais profunda união europeia. Basta-nos observar o sucesso das monarquias em países como o Mónaco e o Liechtenstein, para vermos o quanto uma figura mediática na chefia do Estado pode, além de garantir a sobrevivência nacional em termos políticos, ser uma garantia de rendimentos económicos. O caso da Grã-Bretanha, embora tenha contornos próprios e especiais, também demonstra o elevado prestigio que um país pode adquirir além fronteiras pelo facto de ter na chefia do Estado um monarca.

A figura de um rei, também tem sido utilizada como garante da unidade nacional em países como a Espanha. Não terá sido à toa que o general Franco nomeou o actual rei Juan Carlos para a chefia do Estado espanhol. Se hoje, existe separatismo em Espanha, poderemos imaginar os contornos que esse mesmo separatismo adquiriria se a Espanha fosse uma República. Provavelmente, já não existiria com a unidade territorial que hoje se conhece.

A Itália, que se uniu em torno de um monarca e hoje é uma república, pode bem vir a ser o exemplo de um Estado que se fragmentará, num futuro mais ou menos próximo, por o chefe de Estado não conseguir assumir o papel de garante da unidade nacional.

As vozes mais criticas a uma restauração da Monarquia em Portugal, apresentam factores económicos como base de apoio à sua opinião. Tal aspecto, visto de acordo com a realidade portuguesa que hoje conhecemos, surge como uma falsa questão. É evidente que, actualmente, o Estado tem despesas com a manutenção da Presidência da República, a quem paga um salário mensal, despesas de representação e segurança e com o carro oficial, além de custear a sua residência oficial – Palácio de Belém -. No Orçamento de Estado de 2002, a Presidência da República foi contemplada com o valor de 11 092 018 Euros (o correspondente a 2 223 750 contos) ou seja, 924 335 Euros mensais (o correspondente a 185 312 contos mensais). Se tais quantias se mostram suficientes para a manutenção da Presidência da República, afigura-se igualmente suficiente para manter condignamente a máquina necessária para apoiar um Monarca no exercício das suas funções de chefia de Estado, até porque um rei no regime de uma Monarquia Parlamentar não necessita de uma “máquina” de apoio maior que o actual Presidente da República.

Além disso, existem regalias que os anteriores Presidentes da República mantêm, mesmo depois de terminarem os seus mandatos, que, ao desaparecerem, passarão a significar uma importante poupança para o Estado, sendo de recordar que Portugal já teve, em simultâneo, um Presidente da República em funções (Jorge Sampaio) e quatro na reforma (António Spínola, Costa Gomes, Ramalho Eanes e Mário Soares).

Outro receio dos críticos da Monarquia é o facto de um determinado Rei poder vir a ser incompetente ou sofrer de uma qualquer debilidade mental. Esse, no entanto, é um risco que também pode correr o regime republicano. Um individuo pode ser um político hábil e mostrar-se incompetente no exercício da função presidencial, tal como pode sofrer de uma qualquer doença, inclusive do foro psíquico, só diagnosticada após a sua eleição. Nesse caso, ele será substituído, tal como acontecerá com um rei, se for esse o Chefe de Estado.

Hoje, a ser restaurada a Monarquia em Portugal, ela não poderá ser absolutista. A Monarquia, em pleno século XXI, só faz sentido se for democrática. Num momento em que se acentua a bipolarização política, a figura isenta de um monarca na chefia do Estado, torna-se um garante da continuação democrática; do respeito pela opinião das minorias e, em suma, é um travão ao regresso de uma ditadura partidária, alheia à vontade e aos anseios do Povo, surda aos seus apelos e cega às consequências das suas políticas sociais.

Portugal tornou-se uma República pela via revolucionária, mesmo contra a vontade da maioria do Povo. Hoje, esse mesmo regime nascido da revolução, deverá dar um exemplo de maturidade, dando ao Povo a possibilidade de, democraticamente, decidir, por referendo, qual a forma política que melhores garantias poderá dar à realização das suas ambições futuras.

É o futuro de Portugal que está em discussão! Terão meia dúzia de eleitos o privilégio de o traçar? Ou esse deverá ser o resultado da soma de vontades de todos os cidadãos?



[1] Basta observar o estado de abandono em que se encontram inúmeras ruínas romanas, muitas delas mal exploradas; castelos por todo o país, que se desfazem ao peso dos anos, sem qualquer intervenção que minore essa degradação; os palácios e palacetes, alguns propriedade do Estado, que se encontram fechados e à beira da ruína; muitas aldeias completamente abandonadas, que vão sendo povoadas pelo esquecimento.

[2] Como a Espanha, Grã-Bretanha, Mónaco, Holanda, Suécia, Dinamarca, Noruega, Luxemburgo, Bélgica e Liechtenstein, na Europa; Jordânia, Arábia Saudita, Kuweit, Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Qatar e Omã no Médio Oriente; Marrocos, Lesoto e Suazilândia em África; Nepal, Butão, Tailândia, Japão, Malásia e Brunei, na Ásia; Samoa e Tonga, na Oceania

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