quinta-feira, 17 de março de 2011

AS AUTARQUIAS LOCAIS

Como já tivemos a oportunidade de verificar no Capítulo I.I, a abstenção nas Eleições Autárquicas sempre se situou num valor próximo dos 40%. Não deixa de se poder considerar estranho que, o Órgão de Poder mais próximo do eleitor, seja o que, em média, merece a mais baixa participação do eleitorado na sua eleição.

Certamente que as razões para a ocorrência de tal facto variam de autarquia para autarquia. No entanto, não será de todo improvável que o actual modo de eleição e de administração dos Órgãos Autárquicos seja responsável por uma parte considerável dessa falta de participação eleitoral.

Quando comparadas com os restantes Órgãos de Soberania, as Autarquias têm um número reduzido de eleitores e uma área quase insignificante. No entanto, as suas decisões afectam o dia a dia dos cidadãos de uma forma muito mais evidente. [1] Deste modo, as Autarquias, ao tomarem as suas decisões, estão mais sujeitas à crítica e à indignação dos eleitores.

Também no que se refere ao factor humano, em todas as listas de nomes de todas as Eleições Autárquicas, existem algumas que, embora mereçam o apoio e a confiança dos órgãos político/partidários concorrentes, não colhem a simpatia da maioria dos eleitores. Quanto mais pequeno é o meio, maiores são as probabilidades de existirem questões e conflitos pessoais entre os que se candidatam e aqueles que elegem.

Não sendo possível, na organização política actual, aos eleitores votarem apenas nos candidatos com que se identificam, mostra-se como natural que muitos, confrontados entre votar numa lista composta por indivíduos a quem não reconhecem capacidades e competências para desempenhar o cargo a que se candidatam e não votarem, acabem por optar pela abstenção.

Por outro lado, nas Autarquias é muito mais nítida a existência de compadrios, trocas de favores e protecções político/partidárias. Não quer dizer que não o existam também noutros Órgãos de soberania, nem que tal se verifique em todas as Autarquias Locais, no entanto, sendo o meio mais pequeno, as notícias espalham-se com maior facilidade, para já não falar nos boatos de que muitos autarcas são vítimas.

Quase diariamente, ouvem-se queixas como:

- A de serem aprovados projectos de legalidade duvidosa apresentados por indivíduos ligados à formação política maioritária e chumbados outros mais correctos apresentados por indivíduos independentes ou ligados a outras forças políticas;

- Das obras municipais serem adjudicadas, quase sempre, às mesmas empresas, de que são sócios familiares de autarcas ou indivíduos ligados à força política maioritáriamente representada na autarquia;

- De serem atribuídos subsídios a alguns indivíduos e colectividades e não a outros, que apresentam projectos semelhantes;

- Das Câmaras Municipais atribuírem mais dinheiro às freguesias ganhas pelos candidatos do seu próprio Partido do que às que foram vencidas pelas formações políticas da oposição;

- Das próprias Câmaras realizarem mais obras e de maior envergadura na área de jurisdição das freguesias em que a sua força política saiu vencedora do que nas restantes.

- Dos vencedores dos concursos públicos para admissão de pessoal estarem quase sempre ligados à formação política que apoia o executivo camarário.

- De serem atribuídos pelouros a indivíduos que não têm habilitações e nem capacidade para assumi-los, apenas motivados por questões de estratégia político/partidária.

- De certos autarcas serem subornáveis.

Muitas das criticas que são actualmente feitas, no que se refere à gestão autárquica, poderiam ser evitadas e resolvida com uma alteração profunda na forma de eleição dos órgãos autárquicos, nomeadamente com uma maior abertura aos independentes.

As autarquias têm características muito próprias, que permitem uma gestão completamente independente de qualquer ideologia político/partidária. A abertura da gestão autárquica a listas de independentes – já permitida – deveria ser alvo de alterações. As listas de independentes para as Câmaras Municipais, tal como a dos Partidos, deveria ser completamente independente das que são apresentadas para a Assembleia Municipal e para as Assembleias de Freguesia, sem que a falta de lista corrente a qualquer destes órgãos seja vista como um estigma.

Ás Autarquias Locais, em resumo, deverá ser aplicado, com as necessárias alterações, o modelo já apresentado e defendido para o Governo e para a Assembleia da República. No fundo, trata-se de uma forma de governação idêntica e com órgãos idênticos, não fazendo sentido que a sua forma de eleição seja diferentes.



[1] Se, por exemplo, o Governo mandar cortar uma estrada, essa medida afectará as pessoas que a utilizam nas suas deslocações, mas esses apenas terão um peso simbólico, se tivermos em consideração toda a área de actuação do Governo Central. No entanto, se uma Câmara Municipal mandar encerrar uma rua, o número de pessoas que afectará com essa medida terá um peso substancial, se tivermos em consideração a área de actuação de uma Autarquia.

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